Vícios ocultos em veículos e os direitos do consumidor
Por Alan Nardotto
Foto: jcomp
A Constituição Federal Brasileira estabeleceu a obrigação de o Estado promover a defesa do consumidor (art. 5º, XXXII, CF). Da mesma maneira, a defesa do consumidor foi erigida a princípio da ordem econômica nacional, nos termos do inciso V, do art. 170, da Constituição.
Como forma de colocar em prática a proteção ao consumidor, promulgou-se o Código de Defesa do Consumidor (CDC), que se tornou um marco nas relações de consumo em nosso país. De fato, o Código de Defesa do Consumidor estatuiu expressamente diversos direitos, visando proteger os consumidores e que não estavam previstos em leis anteriores.
Neste sentido, destacam-se as normas de responsabilização dos fornecedores pelos vícios de produtos e serviços. O Código de Defesa do Consumidor trata sobre este tema em seus artigos 18 a 25, os quais representam notável avanço em relação à legislação civil que, antes da promulgação do CDC, aplicava-se às relações de consumo.
Dentro das normas sobre a responsabilização pelos vícios dos produtos, destaca-se o art. 18, do Código de Defesa do Consumidor, a seguir reproduzido:
Art. 18. Os fornecedores de produtos de consumo duráveis ou não duráveis respondem solidariamente pelos vícios de qualidade ou quantidade que os tornem impróprios ou inadequados ao consumo a que se destinam ou lhes diminuam o valor, assim como por aqueles decorrentes da disparidade, com a indicações constantes do recipiente, da embalagem, rotulagem ou mensagem publicitária, respeitadas as variações decorrentes de sua natureza, podendo o consumidor exigir a substituição das partes viciadas.
O vício, segundo o direito do consumidor, equivale a características que afetam o produto, diminuindo-lhe sua utilidade, valor, qualidade ou quantidade. Por exemplo, se o câmbio do veículo, após alguns meses de utilização, deixa de funcionar, estamos diante de um vício do produto.
Em linguagem coloquial, chama-se o “vício” de defeito. Porém, no direito do consumidor, “vício” e “defeito” são conceitos distintos. O vício, como afirmado acima, é uma característica do produto ou serviço que afeta sua utilização, valor, qualidade ou quantidade. Por outro lado, um produto ou serviço é considerado defeituoso quando não oferece a segurança que dele se espera, colocando em risco a integridade física dos consumidores. Exemplificando, um alimento colocado à venda após seu prazo de validade ter expirado, é um produto defeituoso, já que representa riscos à saúde dos consumidores, pois sua ingestão pode ocasionar malefícios.
Além disso, os produtos podem ser afetados pelos chamados “vícios ocultos”, ou seja, aqueles vícios que já estavam presentes quando da aquisição do produto, mas que só se manifestam em momento posterior.
Em relação aos veículos automotores, é muito comum que, após a compra, os consumidores se vejam frustrados, ao se depararem com o aparecimento de vícios desconhecidos. A existência de vícios ocultos em carros é relativamente habitual, tendo em vista a complexidade técnica e tecnológica dos modernos automotores.
Assim, se os carros tiverem problemas que fujam do desgaste natural, afetando, portanto, o normal funcionamento do veículo, é muito provável que se esteja diante de algum vício oculto.
Caso o veículo possua algum vício oculto, o consumidor pode acionar o fabricante ou a concessionária em que tenha adquirido o bem, no prazo de 90 (noventa) dias após a constatação do problema (art. 26, II e § 3º, CDC), para que o vício seja sanado no prazo de 30 (trinta) dias (art. 18, § 1º, CDC).
Se o fornecedor não solucionar o problema, em 30 (trinta) dias, o CDC dá aos consumidores as seguintes opções, a serem adotadas à sua escolha:
Art. 18. (…)
- 1° Não sendo o vício sanado no prazo máximo de trinta dias, pode o consumidor exigir, alternativamente e à sua escolha:
I – a substituição do produto por outro da mesma espécie, em perfeitas condições de uso;
II – a restituição imediata da quantia paga, monetariamente atualizada, sem prejuízo de eventuais perdas e danos;
III – o abatimento proporcional do preço.
Em outras palavras, se o vício não foi resolvido, o consumidor possui as seguintes escolhas: a) a substituição do veículo por outro de mesmo modelo; b) a restituição do valor pago na aquisição do carro e c) o abatimento do preço pago pelo bem.
É importante ressaltar que a resistência em atender à escolha exercida pelo consumidor é abusiva, e diante da negativa do fornecedor, os consumidores podem acionar o Poder Judiciário, objetivando a efetivação de seus direitos.
Inclusive, diante das peculiaridades do caso concreto, há a possibilidade de fixação de indenização por danos morais, caso a conduta do fornecedor lesione gravemente o consumidor. Assim, por exemplo, se o problema não é solucionado e o consumidor se vê privado do uso e gozo do veículo, os danos morais são cabíveis, tendo em vista que o comprador se viu frustrado em relação às expectativas geradas quanto ao produto: a utilização do bem como meio de transporte.
Porém, somente as especificidades de cada caso poderão indicar se há vícios ocultos e se é possível a indenização por danos morais. Para sanar tais dúvidas, é preciso sempre consultar um advogado, profissional habilitado para o aconselhamento jurídico.